terça-feira, 24 de agosto de 2010

Moiselle


Já se fazia madrugada naquele sábado de aleluia, como se costuma chamar o pós sexta-feira santa no Brasil. 03 de Abril de 2010, esse dia recebera uma noite de lua cheia incomum. O céu se fazia nebuloso, o mar sereno descaracterizava-se diante da turbulenta chuva que invadira sua alta maré.
As noites de outono na França, vez por outra, costumavam ser agradáveis. E na Bahia, elas sempre se faziam presentes. Minha sensação de satisfação encontrava-se em tal grau, que me vira arrebatado a cada dia e noite naquele lugar de cores e amores.
Parecia que aquela noite era pra poucos, e era. Passei meu perfume francês, J’am pour l’amour, e com a indumentária também francesa, segui em busca do que eu não sabia ainda o que era. Seis meses havia se passado e por vezes acreditara que meus dias seriam sempre uma curva em exponencial.
Assim como as intempéries, minha noite, naquele dia, também se descaracterizou. Uma efervescente mulata brasileira, tipicamente baiana, ecoou, tomando a cena do que parecia ser mais uma mera noite dançante. A mais bela. Posso assegurar que em todo aquele semestre, dentre as mais variadas curvas que tive o deleite de contemplar, aquelas se fizeram as mais deliciosamente delirantes.
Mantive-me por um momento extasiado. E pensei: “- É a mulata mais linda que já vi!”. Seus brincos de penas coloridas elucidavam e a emaranhavam num labirinto de sensualidade nativa. Seu belo vestido abrangia pouco espaço, dando-me lugar ao mais cabal campo de observação.
Por um instante pensei que tudo não passaria de um pasmo platônico, mas eis que num rompante, fitou-me pelo canto do olho. Um olhar lascivo. Permaneci, olhando para ela. A expressão em seu rosto era de determinação e propósito. Estremeci ao perceber que se movimentara em minha direção. Seus passos suaves e paradoxalmente firmes, associados ao seu movimento concernente aos prazeres da carne, fizeram-me eternizar aquele momento.
- Boa noite! – disse ela num soar lúbrico.
- Boa noite. – retruquei com meu sotaque europeu, num estado mórbido.
Poucas foram às frases entoadas por ela. Em contra partida, nossos olhares transcorreram anos entre nós. E na precisão que a quilha corta uma onda, embutimos o mais sublime e voluptuoso beijo francês. Ali, fora luxuriosamente minha. O ali que pronuncio já se fizera à La Maison. Amamo-nos intensamente por toda aquela noite nebulosa e torrencial, até que adormeci em seus braços aromáticos e macios.  
E no mínimo espaço em que o tempo se divide, pensei que seriamos protagonistas da versão francesa do clássico de Shakespeare, pois minha mãe me fizera Romeu de nome, mas ao despertar os olhos, minha Julieta não se encontrara mais ali. “Joga pedra na Geni”.

Renara Afonso.

Nenhum comentário:

Postar um comentário